sexta-feira, 1 de novembro de 2013

ONDA DE VIOLÊNCIA DE 2012 PODE TER MATADO 370 EM SP

Vista panorâmica da comunidade de Paraisópolis, com nuvens carregadas ao fundo (Foto: Marcelo Mora/G1)Paraisópolis, na Zona Sul de SP, teve policiamento reforçado no fim de 2012. (Foto: Marcelo Mora/G1)
Levantamento da Defensoria Pública de São Paulo aponta que 370 pessoas podem ter sido mortas no estado, entre maio e dezembro de 2012, como resultado da onda de violência entre criminosos da facção que age dentro e fora dos presídios e policiais militares. O número corresponde a 10% do total das vítimas assassinadas no período.
A Defensoria, que usou como base dados de reportagens, quer agora acesso a dados de boletins de ocorrência e prepara uma ação contra o estado para pedir indenização para parentes de vítimas. Para isso, os defensores públicos Carlos Weis e Daniela Skromov ainda buscam identificar todas as vítimas.
O que é onda de violência?
Termo utilizado para designar conflito entre criminosos e policiais, principalmente militares.
O termo onda de violência contempla o aumento dos índices criminais durante determinado período, principalmente o de homicídio, mas tem sido utilizado por entidades de direitos humanos e de estudos da violência para designar o conflito entre criminosos e policiais, principalmente militares.
Assim como em 2012, segundo o Núcleo de Estudos de Violência (NEV) da Universidade de São Paulo (USP) em 2001 e 2006 ocorreram atentados contra agentes das forças de segurança e, como resposta, ataques contra os suspeitos. Em 2001, uma mega rebelião em quase 30 presídios paulistas deixou cerca de vinte mortos. Naquela ocasião, a facção se rebelou por causa da transferência de suas lideranças. Em 2006, quando ocorreu a maior onda de violência que deixou quase 500 mortos, segundo a pesquisadora do NEV Camila Nunes Dias, houve uma resposta dos criminosos contra extorção policial.
De acordo com análise do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos do órgão, 126 dos mortos não foram identificados em 2012. Ainda segundo o documento, das 370 pessoas assassinadas, 320 eram civis e 50, agentes das forças de segurança estadual e municipais, que são policiais militares, policiais civis, agentes penitenciários e guardas-civis. A vítima mais jovem desse conflito foi uma criança de 1 ano e sete meses e a mais velha, um idoso de 83 anos que havia servido na Polícia Militar (PM) e estava aposentado.
Números da violência
Onda de ataques deixou 370 mortos em 38 cidades paulistas
Entre as vítimas havia duas crianças, 26 adolescentes, 225 adultos e dois idosos. Ao todo, 115 não tiveram a idade revelada.
50 eram agentes de segurança (PM, guarda-civil, policial civil ou agente penitenciário)
Dia mais violento foi 21 de novembro de 2012, quando 24 pessoas foram mortas
Cidades com mais ocorrências:
São Paulo (159 mortos)
Guarulhos (30 mortos)
Guarujá (17 mortos)
Além dos parentes de mortos por PMs, familiares dos policiais militares mortos por criminosos, durante o trabalho ou de folga, também estão entrando com processos judiciais para que o Estado pague algum benefício a elas. Em novembro passado, o governador Geraldo Alckmin anunciou o aumento do seguro de vida para PMs. "Autorizei que o seguro no caso de morte passasse de R$ 100 mil para R$ 200 mil. E não será apenas para o policial no seu trabalho, mas é na sua condição de policial", disse à época.
Onda de violência: início
A onda de violência começou em maio de 2012, quando seis criminosos foram mortos pela PM na Penha, Zona Leste da capital paulista, segundo investigações do Ministério Público. Para vingar essas mortes, presos ordenaram ataques contra agentes. Os policiais reagiram e mataram integrantes da organização criminosa que atua dentre e fora das prisões. Depois, criminosos passaram a incendiar ônibus, e moradores de comunidades carentes relataram toques de recolher.
Em outubro passado, a PM ocupou a favela de Paraisópolis, na Zona Sul da capital, alegando que dali partiram os atentados para assassinar policiais. Um gabinete criminal de crise temporário foi criado no Tribunal de Justiça e durou por cerca de 120 dias (até meados de março de 2013), com a missão de administrar pedidos e decisões relacionados a presos, transferências e saídas temporárias. Após divergências políticas, o governo estadual e o federal assinaram acordo em novembro para transferência de detentos suspeitos de planejar a ofensiva contra às forças de segurança.
Questionado sobre a ocupação de Paraisópolis pela PM, o secretário da Segurança Pública, Fernando Grella Vieira, afirmou que pasta tem planos para a comunidade. "Paraisópolis foi ocupada por três meses. Temos atualmente uma base [da PM] próxima. E estamos estudando implantar uma base [da PM] na comunidade", disse.
Apesar de a Defensoria Pública ainda não ter formalizado pedido à Secretaria de Segurança Pública para a identificação dos casos individuais relativos à onda de violência, os defensores afirmaram que procuraram policiais civis do Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) sobre a possibilidade de ter acesso a dados de mortes durante a onda de violência.  “Não tinham nada. Só estavam investigando casos suspeitos”, disse Carlos Weis.

DHPP investiga casos 'suspeitos'
Procurado para comentar o assunto, o delegado Itagiba Franco, diretor da Divisão de Homicídios do DHPP, afirmou que a investigação policial concluiu que os seis suspeitos mortos pela Rota em 28 de maio foram executados. “Três PMs foram presos em flagrante pelos assassinatos e indiciados. Soubemos que o Ministério Público os denunciou pelos crimes, foram julgados, mas todos acabaram absolvidos e foram soltos”.
Na nossa visão, durante alguns meses o estado não tomou medidas adequadas para conter essa onda de violência. Isso enquanto um policial era morto num lugar e sempre ocorria uma chacina próxima a esse local"
Carlos Weis,
defensor público
O departamento especializado da Polícia Civil investiga as mortes decorrentes de confrontos entre policiais militares e criminosos.  A Corregedoria da Polícia Militar também apura se existe envolvimento de PMs em milícias ou grupos de extermínio. Os responsáveis pelo levantamento sobre os mortos no ano passado ainda não tiveram acesso às conclusões desses inquéritos.

Ainda segundo o Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos, o órgão pretende ingressar com uma ação civil pública contra o governo de São Paulo ‘por conta da ocorrência de dano moral coletivo’. “O estado não pode, através de sua ação ou de sua inação, agravar a sensação de insegurança. Na nossa visão, durante alguns meses o estado não tomou medidas adequadas para conter essa onda de violência. Isso enquanto um policial era morto num lugar e sempre ocorria uma chacina próxima a esse local”, disse Carlos Weis.
Policial fiscaliza morador durante operação na favela de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo. (Foto: Nacho Doce/Reuters)PM fiscaliza morador de Paraisópolis em ocupação
da comunidade (Foto: Nacho Doce/Reuters)
‘Outubro e novembro vermelhos’
Pelo relatório da Defensoria Pública, 38 cidades do estado foram alvos dos ataques. A capital concentrou a maioria dos mortos em relação aos outros municípios: 159. Ainda de acordo com o levantamento do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos, entre maio e dezembro, o estado de São Paulo teve 23 dias com mais de seis mortes em 24 horas.

Outubro, com 90 mortes, e novembro, com 162 assassinatos, foram os meses mais violentos no estado. O dia mais sangrento em SP ocorreu em 21 de novembro, quando 24 pessoas foram assassinadas. As mortes aconteceram em Praia Grande, Osasco, São Paulo, Guarulhos, Osasco e Itaquaquecetuba. Os dois dias anteriores, 19 e 20 de novembro, também foram extremamente violentos, com 13 mortes cada.

Pesquisa
O levantamento feito pela Defensoria Pública contou com o trabalho de 37 defensores e foi concluído em 12 dezembro. Eles buscaram informações sobre vítimas e casos de homicídios em diversos veículos de comunicação para subsidiar a atuação do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos.
Foram analisadas 913 notícias de mortes, pesquisadas em mídias  impressas e digitais, de maio a 5 de dezembro. As reportagens foram classificadas em quatro categorias:

- provavelmente sim (a morte pode estar relacionada à onda de violência);
- provavelmente não (a morte não está relacionada à onda de violência);
- talvez (como informações não foram precisas, órgãos de segurança pública foram procurados para tentar identificar casos que poderão ser ou não incluídos na pesquisa);
- impossível classificar (não há dados suficientes para considerar caso)
“O objetivo é exatamente mapear as informações públicas para que tenhamos elementos suficientes para buscar informações junto aos órgãos de segurança pública, partindo para uma terceira fase da pesquisa em que será possível buscar padrões de violações de direitos humanos e então traçar uma estratégia de atuação”, disse Daniela Skromov.
Mas para isso é necessário confrontar os dados da pesquisa com boletins de ocorrência sobre os casos de homicídios. “Nesse sentido, será possível analisar de forma qualificada se há e quais são as relações entre as mortes de civis e agentes do Estado”, diz o documento da Defensoria

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